Salvo o erro, creio que o estudo promovido e divulgado no IV Congresso da SEDES (associação cívica portuguesa fundada em 1970), intitulado A Qualidade da Democracia em Portugal: A Perspectiva dos Cidadãos, dirigido por Pedro Magalhães da Universidade de Lisboa, com o apoio da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento e da Intercampus, passou ao lado da opinião pública e dos políticos portugueses, facto que lamento profundamente.
Ainda que tenha contado com algum impacto mediático, foi assim que tomei conhecimento, e mesmo que muitos possam afiançar que não passa de mais um estudo igual a tantos outros, os resultados apurados dever-nos-iam obrigar a reflectir sobre a percepção que temos sobre a nossa democracia.
O estudo apresenta um enorme grau de desconfiança na democracia, indo até mais longe nas conclusões apresentadas, nomeadamente quando se assevera o descrédito da justiça. Entre os inquiridos, “mais de dois terços consideram que a justiça não trata de maneira igual pobres e ricos e trata de uma forma diferente um político e um cidadão comum” e “a maioria sente-se desincentivada de recorrer aos tribunais para defender os seus direitos”.
No estudo em causa, é notório também o distanciamento entre eleitores e eleitos. Mais de 60 por cento discordam da ideia de que “os governantes têm muitas vezes em conta as opiniões dos cidadãos”, 73 por cento não se revêem na afirmação que “as pessoas como eu têm influência sobre o que o Governo faz”, 75 por cento discordam da frase “os políticos preocupam-se com o que pensam pessoas como eu” e, a mesma percentagem de inquiridos, discorda com a ideia de que “quem está no poder não busca sempre os seus interesses pessoais”.
Assim, não será de estranhar que 16 por cento dos inquiridos se sintam nada satisfeitos com a democracia, 35 por cento se sintam pouco satisfeitos, ou seja, mais de metade têm uma opinião muito negativa em relação à nossa democracia.
Neste enquadramento, é muito difícil passar ao lado destes resultados sem, pelo menos, dar uma opinião ou tentar, como deveria ter sido feito pelos políticos, sejam eles de que quadrante for, anunciar um conjunto de medidas para reverter este quadro.
Por mais que seja difícil de explicar às pessoas que isto pode mudar, ainda creio, e porque sou optimista, que poderão haver saídas para esta crise de identidade. Fundamentalmente, apesar de tantos erros e de tanta gente desonesta ter vencido na vida à custa da desilusão criada em tantos cidadãos, cujo voto foi fundamental para essa vã conquista, ainda acredito num certo tipo de justiça social que nos permita separar o trigo do joio e que faça com que as pessoas regressem à necessidade de cumprir os seus deveres cívicos sem mais desculpas.
É um trabalho de todos. E, nesta missão, por mais razões que as pessoas desiludidas possam ter, há sempre algo que terá de ficar no cerne do nosso comportamento: não há outra alternativa à democracia que não seja uma democracia participada. Só assim será garantida a nossa própria liberdade.
Publicado Jornal Região Sul, edição de 15 de Julho de 2009. Link: http://www.regiao-sul.pt/noticia.php?refnoticia=96038
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