terça-feira, 7 de julho de 2009

DE UM TEMPO AUSENTE

Começo por escrever estas linhas sabendo o quão longe estou de casa. Dentro do meu país, mas com uma realidade diferente, onde pontificam outros hábitos e porque não dizê-lo, formas de cultura dissemelhantes, estou de férias.
Conheço bem alguns dos sítios onde estou neste momento. Algures no distrito de Viseu, mais concretamente em Moimenta da Beira, terra dos meus pais, sei que sinto sempre um enorme prazer em estar por cá. Sei também que são realidades que considero complementares, dentro de um país todo diferente e todo igual.
Tive a oportunidade de visitar, durante estes dias, a cidade de Bragança, Vila Real e Mirandela, fazendo uma visita turística nordestina, o que me reforçou a minha leitura sobre alguma da desertificação a que o nosso país está votado desde há algum tempo.
Claro que não falo destes três locais que acabo de mencionar, nem tão pouco dou como exemplo o caso da vila onde estou, mas fico com a sensação inabalável que o próprio crescimento destes e de outros locais, têm sido o reflexo de um abandono das pessoas que antigamente viviam nas suas periferias e que agora tentam encontrar um novo rumo para si e para os seus.
Ainda nestes dias, talvez pelo meu apetite confesso por aquelas paisagens quase bucólicas que por aqui abundam, tive a oportunidade de visitar alguns locais onde se sente claramente um tempo ausente, como que se tivesse parado por artes mágicas.
Poucas casas, pouca gente e, aquele sensação de que aqueles que vemos são de uma idade avançada e, por isso, perfeitamente resignados ao que têm.
Assim, é como se vivesse num dilema. Por um lado, senti-me bem por estar ali, gozando uma súbita paragem do tempo, sem acesso a telemóveis e com uns pulmões cheios de ar puro, mas, por outro lado, não consegui suprimir a sensação de que um certo Portugal morre aos poucos e não tem capacidade de se regenerar.
A desertificação destes locais gera problemas que são difíceis de resolver. São centenas de lugares que parecendo agora abandonados, antes geraram vidas, honraram tradições, consolidaram a nossa história e a própria cultura, e, por isso, mereceriam um acompanhamento diferente.
Ao Governo, enquanto primeiro responsável pelo equilíbrio territorial, exige-se que seja capaz de ser a mola inspiradora que mais ninguém poderá igualar. Pedem-se acções rápidas, que alterem o rumo dos acontecimentos, fazendo com que haja uma discriminação positiva e um conjunto de incentivos que façam regredir este êxodo.
Pede-se também aos agentes locais, pela sua familiaridade com todos estes assuntos, que possam ajudar a fixar as pessoas em muitos desses lugares, dando-lhes condições para que possam ter qualidade de vida e trabalho.
O esforço contra a desertificação é de todos. O país também pertence e diz respeito a todos. E, mesmo com as realidades e vivências diferentes que encontramos cada vez que vamos para fora cá dentro, todas essas coisas que ainda existem hoje e as que pudéssemos recuperar, certamente fariam de nós um melhor Portugal.
Ora, todos o sabemos, esta constatação faz muito mais sentido nas horas em que mais precisamos de o provar. Eis esse tempo.

Publicado no Jornal do Algarve, edição de 2 de Julho de 2009

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