sexta-feira, 28 de agosto de 2009

CRISE? QUAL CRISE?

As duas histórias contam-se rápido. Uma tem a ver com a venda de um automóvel e outra com aquilo que se costuma designar por contratos com lavandarias.
A crise que vivemos deveria, pensava eu, trazer uma flexibilidade de pensamento e acção que, embora respeitasse algumas regras básicas, fosse mais ao encontro das pessoas e do novo enquadramento económico. Pensava…
Imaginem uma compra de um automóvel. Apesar do comprador esperar fazer um super negócio, porque estamos em crise, do outro lado, aparentemente, a mentalidade não mudou em nada. Procuram fazer bons negócios também, e isso aceito porque são as regras do mercado, mas, em vez de facilitarem e flexibilizarem os processos morosos de debate sobre o melhor preço, ficam ainda agarrados a métodos antigos e preferem ficar com o automóvel, mesmo que isso implique que se torne um activo parado a um canto.
Por outro lado, imaginem o que é ter contrato com uma lavandaria, pagando uma soma por um número de peças. Dizem-nos repetidamente que temos de obedecer cegamente ao limite temporal mensal, mas não explicam o porquê nem o sentido dessa coisa.
Está escrito, é verdade. Mas, se por absurdo, o cliente levar mais dias do que o previsto, estará a lavandaria preparada para perder esse cliente, em vez de o manter? Pelos vistos, sim, preferem.
Estes são dois exemplos, entre outros que tenho tido conhecimento. São absolutamente anormais para o tempo em que vivemos, e, desculpem a minha teimosia, ninguém me conseguiu ainda convencer que estou errado.
As regras do mercado são explícitas. Todos procuram fazer grandes negócios e precisam desses lucros para viver. A esta mentalidade, admito, há ainda um pequeno número de pessoas que entende que para existir um bom negócio, é preciso que ambas as partes, comprador e vendedor, fiquem satisfeitas.
Todavia, em tempos excepcionais, acções e comportamentos excepcionais. Não se pede a ninguém que perca dinheiro de uma forma absolutamente ridícula e que ponha em causa a sua própria sobrevivência, mas exige-se, de uma forma séria, que quem vende entenda o cenário de crise e se coloque numa posição mais favorável, e que daí até tente encontrar oportunidades de negócio.
Os casos que aqui trouxe são reais. Eles aconteceram ou continuam a acontecer. Daí a pergunta que serve de título para este texto. E, se vermos bem, ela faz todo o sentido porque, na prática, parece que muitos ainda não perceberam que estamos em crise e que se não forem dados estímulos para as pessoas efectuarem as suas compras, haverá uma retracção que inevitavelmente terá sérias repercussões nos seus negócios.
Diz-nos a história que ou se age na altura certa ou então torna-se demasiado tarde. Porém, esta é uma lição de vida que muitos, pelos vistos, ainda não assimilaram.

Publicado no Jornal do Algarve, edição de 27 de Agosto de 2009

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

ASSIM VAI PORTUGAL

A leitura pormenorizada do que vem publicado recentemente na imprensa, leva-nos directamente para o campo do imaginário, embora, tal devaneio, possa ser perigoso e até carente de alguma compaixão. Por entre tantas notícias de silly season, reparei em três notícias que merecem alguma reflexão.
Se é certo que a escravatura foi abolida em todo o Império Português, com a lei de 25 de Fevereiro de 1869, até ao termo definitivo de 1878, não é incomum voltarmos a falar deste assunto.
Ao desfolhar o Jornal Público, edição de 11 de Agosto, somos estranhamente convidados a conhecer o caso do Alentejo onde «há imigrantes a trabalhar sob violência, extorsão e medo». E não ficamos por aqui. Bastaria ler o primeiro parágrafo para entendermos a dimensão verdadeiramente ultrajante do caso. «Violência física, extorsão de dinheiro dos salários, trabalho de sol a sol, fome e medo: É este o quotidiano de imigrantes romenos e tailandeses».
Não sendo um caso novo, impõe-se que se faça alguma coisa. Mesmo que por detrás destes dramas se encontrem máfias com treino militar, e por isso, verdadeiramente perigosas, não podemos ficar reféns ou à mercê deste tipo de gente.
Se for mais longe nesta questão, terei de abordar a qualidade e quantidade de imigração do nosso país. Sim, eu sei, somos também um país de emigrantes. Mas interrogo-me há muito tempo, e sem que isso signifique que sou xenófobo ou intolerante, até quando esse pretexto vai servir para facilitar a entrada de toda a gente, sem uma fiscalização posterior que possa aquilatar a sua integração no nosso país, na mesma forma que acontece a milhares de portugueses por esse mundo fora?
Mudemos de página, o que nos permite ir ao encontro da Gripe A, salvo seja, claro. As recentes notícias inquietam-nos. Embora tal fosse previsível, e ainda vamos no início, gostaria de trazer à colação algo que foi dito pela Ministra da Saúde e que, isso sim, talvez mais do que a doença, deve preocupar.
Ao considerar que algumas pessoas tinham “comportamentos anti-sociais”, esta acusação, vem por a nu actos que espelham atitudes pouco prudentes, o que favorece o contágio e põe em causa a saúde pública. Já não basta um mal, só faltava outro.
Por isso mesmo, e rumo à terceira notícia, com um país com pessoas com tantos defeitos (é o que costumamos dizer quase sempre), será que o caminho seria a restauração de monarquia?
Pelo menos, foi o que pensaram um conjunto de amigos que tiveram a ousadia de hastear a bandeira azul e branca da monarquia, usada em Portugal até 1910, nos paços do concelho de Lisboa. Tal gesto, que poderá valer uma sanção criminal, é, nas palavras dos seus autores, «uma inédita acção de guerrilha ideológica».
Para além do seu acto, ainda que imbuído de um forte sentimento ideológico, o que mais prendeu a minha atenção, é a forma como alguém sobe à varanda da Câmara de Lisboa, sem que ninguém note, estando mesmo ao lado uma esquadra da polícia.
Vá lá que era uma brincadeira. Mesmo assim, fica o aviso.

Publicado no Jornal Região Sul, edição de 19 de Agosto de 2009. Link: http://www.regiao-sul.pt/noticia.php?refnoticia=97100

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

A Crónica do Jornal Expresso

Geralmente, tenho seguido a regra de usar este espaço para publicar apenas o que escrevo para a imprensa. E, enquanto não mudar de ideias, assim vai continuar. Todavia, este post, não podia ficar na gaveta. Trata-se de um agradecimento pessoal ao Professor Efigénio Rebelo, ilustre Presidente da Faculdade de Economia da Universidade do Algarve, pelo convite que me dirigiu, no sentido de escrever para a edição on line do Jornal Expresso.

Como poderão verificar a crónica já foi publicada. Ao Professor e à Faculdade que dirige, o meu muito obrigado.

UM ALGARVE DE E PARA TODOS

A frase soou como um trovão. No auge do mês de Agosto, duas senhoras, numa cidade algarvia de forte pendor turístico, e perante uma multidão de pessoas e carros que obstruíam as vias de acesso, censuravam: “nunca mais vem uma trovoada para que esta gente se vá embora”.

Ora, numa região que, em 2008, liderou os proveitos por estabelecimentos hoteleiros, com 580 milhões de euros, num sector económico que obteve o ano passado receitas totais de 7.500 milhões de euros (dados do Turismo de Portugal), e onde, por consequência, os residentes, de uma forma directa ou indirecta, dependem dessa industria, a frase é bastante perigosa e até incoerente.

Todavia, estes desabafos, comuns durante os meses mais agitados, não colocam em causa uma das características que mais nos distingue, isto é, o saber receber, nem tão pouco, indiciam alguma ideia de separatismo geográfico. São antes, uma crítica explícita aos anos sucessivos em que imperou uma ausência de rigor no planeamento urbanístico e que obrigam hoje, os lugares mais turísticos, a uma flexibilidade quase impossível, devido ao facto de um aumento exponencial de residentes, o que naturalmente gera incómodos.

A resposta a este problema, com certeza, não será a vinda da dita trovoada. Mas terá de passar pelo planeamento de um novo Algarve, ainda mais capaz de incluir todos, sejam os visitantes ou visitados, criando condições para uma coexistência mais proveitosa, de preferência não apenas residual, mas distribuída ao longo do ano.

O Algarve enferma de vários problemas. Conforme a análise feita no Plano Estratégico Nacional do Turismo que define as acções para o crescimento sustentado do Turismo Nacional nos próximos dez anos, esta região é, essencialmente, um destino de Sol e Mar, o que tem como consequência uma elevada sazonalidade (taxa de ocupação de 64% nos meses de Verão, com o pico a verificar-se em Agosto, com uma taxa de ocupação de 76% e uma taxa de ocupação de 20% nos meses de Inverno).

Numa altura em que se discute cada vez mais a importância dos lugares e as vantagens das especificações históricas, sociais ou políticas de cada um, importa, por isso, olhar para o Algarve e para os algarvios com alguma atenção, evitando criar desfasamentos que não interessam, ao invés de uma complementaridade que é desejável.

O projecto Allgarve tem espírito. Compreendo-o se mo explicarem enquanto garantia para incluir esta região na senda de um lugar com glamour, aberto a uma panóplia de cultura e capaz de seduzir um certo público com vocações e interesses muito próprios.

Todavia, há um outro Algarve que não pode ficar menosprezado. Falo de um conjunto largo de cidadãos que não conseguem frequentar esses meios, que residem cá durante o ano inteiro e que merecem uma política de medidas próprias que elevem a qualidade de vida nesta região, aliando todos os eventos, não os fazendo sentir à parte e encontrando um equilíbrio necessário.

Não tenham dúvidas. O Algarve continua apelativo e irá continuar a sê-lo, desde que consiga superar todos os desafios da modernidade que se lhe exigirão a muito breve prazo. Estes passam pela consolidação de dez produtos turísticos estratégicos: Sol e Mar, Touring Cultural e Paisagístico, City Break, Turismo de Negócios, Turismo de Natureza, Turismo Náutico (inclui os Cruzeiros), Saúde e Bem-estar, Golfe, Resorts Integrados e Turismo Residencial, e Gastronomia e Vinhos.

Para todos eles temos resposta, desde que os responsáveis políticos que enfrentarão esses desafios, seja no plano local/regional ou a nível do governo central, consigam entender e projectar um conjunto de medidas que nos tragam um reforço de complementaridade, para ir ao encontro de um Algarve inclusivo e capaz de responder às expectativas diferentes de cada um.

Aos problemas detectados no mesmo Plano Estratégico Nacional de Turismo, que, entre outros pontos, indica a dependência sazonal da região e que foca a necessidade de uma requalificação hoteleira, falta pensar um Algarve que tenha em conta o que as pessoas que andam na rua, no dia a dia, sentem, promovendo a sua opinião e manifestando interesse pelas mesmas.

O marketing dos lugares e asseveração de um conjunto de branding commodities não funciona se não conseguirmos projectar a imagem de uma consciência social (que já existe mas que tem de ser aperfeiçoada), que garanta à partida o empenho de todos face à missão principal da região, sabedoria que aproveitará melhor ainda as vantagens estratégicas que temos e das quais nos orgulhamos.

Esse patamar é, aliás, fundamental para projectarmos positivamente esta região num quadro de uma concorrência feroz, reafirmando-a como um ponto turístico de referência mundial.

Não tenho dúvida nenhuma que todos querem o mesmo, isto é, um Algarve forte, com condições para todos e capaz de continuar a liderar e transformar em realidade todos os nossos sonhos, dos quais não abdicamos. A trovoada, essa, pode certamente esperar pelo Inverno, quando for o tempo natural para as mesmas.

Publicado, no dia 10 de Agosto de 2009, na edição on line do Jornal Expresso. Link: http://aeiou.expresso.pt/um-algarve-de-e-para-todos=f530209

CONVENÇAM-NOS

Daqui a menos de dois meses, disputar-se-ão as eleições legislativas. Até lá, por entre todo o barulho de fundo a que estamos acostumados, certamente, seremos confrontados com muitas propostas políticas que merecerão ou não o nosso apoio.
Hoje, segundo o que se mede amiúde através de múltiplas sondagens, sabe-se que os portugueses estão, cada vez mais e quase num sentido irreversível, descontentes com os actos públicos praticados (leia-se medidas governamentais), embora ainda acreditem, aqui e acolá, no que se lhes promete antes das eleições. Mas é sol de pouca dura.
Cada vez mais atentos e esclarecidos, os eleitores, sabem distinguir quem é este ou aquele candidato e qual o histórico de cada partido no exercício da nossa democracia.
Ora, isto significa que apesar do alheamento a que a política está votada, nestas ocasiões pré eleitorais, os portugueses procuram fazer os seus equilíbrios. Mesmo que ainda exista espaço para um certo romantismo político, ora porque gostamos de ouvir aquele sound bite, ora porque gostamos daquela pessoa concreta ou, simplesmente, porque gostamos daquilo mas não sabemos bem porquê e atribuímos tudo à empatia que sentimos, o certo é que a razão (pelo menos aquela que achamos ser a nossa) tende a situar tudo de uma forma mais complexa.
Hoje, comunicar no sentido político, exige uma clarividência que não está ao alcance de todos. Há que saber contrariar os preconceitos bizantinos, pugnando por uma abertura de horizontes e pelo arrojo de novas ideias e projectos.
Apenas assim se poderá combater o descrédito assente na nossa sociedade e vencer aquela ideia de que vale tudo, desde que os próprios políticos falem em nome dos portugueses. Aliás, esta última ideia, enferma num problema que me parece elementar. Ninguém deveria falar em nome dos portugueses constantemente, como se eles fossem uma massa inerte e até de alguma forma seguidista, porque ninguém foi mandatado para os representar ao minuto.
Não se deve nem pode confundir o mandato político de quem ganha e por isso tem de governar, com uma apropriação do Estado a seu belo prazer, arrogando-se a todas e quaisquer iniciativas ao abrigo desse chapéu-de-chuva.
Hoje dar um voto a alguém não é conferir um mandato cego e sem responsabilidades. Ainda que não possamos fiscalizar o trabalho de quem nos governa de uma forma mais assídua, independentemente do partido que lá esteja, o caminho terá de passar pela criação de instrumentos que possam garantir uma maior participação dos eleitores entre eleições, o que não significaria governar sob cordas, mas implicaria uma proximidade dos eleitos aos eleitores.
É por estas e por outras situações que estes momentos eleitorais encerram em si um conjunto de vectores que julgo fundamentais. Eis chegada a hora de nos esclarecerem convenientemente e tal missão já não pode ser encarada levianamente.
Podemos achar muita piada às camisolas, porta-chaves e canetas que nos entregam. Mas, certamente, não serão com essas “futilidades” que os partidos marcarão a agenda política, nem tão pouco conseguirão conquistar o nosso voto.

Publicado no Jornal do Algarve, edição de 6 de Agosto de 2009
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