sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

FALEM-ME DO FUTURO

Um dos álbuns dos Trovante, precisamente o último, tipo best of, tinha um nome curioso, Saudades do Futuro. Ora, são precisamente estas palavras que não me têm abandonado nem sequer por um segundo nos últimos tempos. E porquê?
Sabemos todos que não vivemos tempos fáceis. Estamos falidos ou em pré falência, andamos numa corda bamba que não é de boa moda e sentimo-nos inseguros como nunca nos sentimos antes. Este é o retrato da maioria de nós.
O que aí vem não é melhor. Todas as pessoas que nos entram pela casa dentro, nos últimos dias e meses, têm pintado um futuro negro, cada vez mais escuro sem qualquer tipo de misericórdia.
Não escondo que não gosto de viver iludido. Por isso, muitos daqueles especialistas que ouço quase todos os dias devem ter razões suficientemente fortes para tanto pessimismo. Ora, como sabemos, pessimismo gera pessimismo e, como tal, é normal que vivamos hoje todos desconfiados, amargurados e cientes de que tudo isso será muito mau mesmo.
Agradeço-lhes a sua sinceridade, mas questiono e a esperança onde fica? Se tudo for tão mau assim, sem um pouco de confiança, sem um pouco de vontade em que as coisas melhorem, valerá a pena viver em tamanha desgraça? O que diremos então aos nossos filhos? Que futuro terão eles neste mundo?
Sinto que tudo tem um tempo. Sei que não viveremos tempos fáceis, mas também sei que serão esses momentos que instigarão os seres humanos a superarem-se e a encontrarem formas de ultrapassar as dificuldades.
Chamem-lhe a crónica da ilusão. Digam que estas palavras são de um non sense que já não se usa, mas começo a ficar farto de tantas previsões negras, sem sequer se preocuparem em anunciar medidas que possam clarear tal escuridão.
Hoje vivemos uma moda do apocalipse e isso vende porque é notícia. Volto a escrever para que não restem dúvidas. Não quero viver na mentira, na ilusão porque sei que pior cego é aquele que não quer ver. Todavia, não podemos confundir o realismo com o pessimismo sem solução, nem a verdade com um eterno dramatismo atroz quando ele pode ser minorado.
Apelo aos políticos com responsabilidades e aos agentes financeiros que saibam falar com as pessoas. Que nos expliquem a crise, que nos falem a verdade, mas que saibam também conduzir as pessoas para as soluções que se impõem porque sei que na verdade, também podemos encontrar caminhos que nos protejam e alertem para novas maneiras de pensar e agir.
O desafio está lançado. E não é apenas porque é Natal. É porque não podemos admirar quem fala de esperança, quem saudámos recentemente pela sua eleição (Barack Obama), mas depois habitamos fechados numa concha hermética, vivendo do anúncio das desgraças, sem sequer semear a esperança e vontade de fazer um mundo melhor.

Publicado no Jornal Região Sul, edição de 24 de Dezembro de 2008
link http://www.regiao-sul.pt/noticia.php?refnoticia=90760

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

UM DIA PODEREMOS SER NÓS… OU JÁ O SOMOS?

Estar quase trinta dias sem escrever é complicado. Naturalmente, vamos juntando dezenas de ideias sobre assuntos que gostaríamos de abordar, e isso, quase sempre, reflecte-se numa vontade de querer falar sobre tudo, correndo o risco de não desenvolver em profundidade quase nada.
Porém, por estes dias, não falar da avaliação dos professores; da ideia profundamente agora provada de que andávamos a ser “roubados” escandalosamente quanto ao preço dos combustíveis; dos novos pobres (reportagem dramática, publicada na semana passada pelo JN); do passo positivo da Comissão Europeia para ajudar a estimular a economia da Europa, entre outros assuntos, é estar fora dessa avalanche de informação.
Perante tantos assuntos, todavia, nem pestanejei em escrever sobre a nova pobreza que por aí grassa e os novos tempos que se avizinham. Faz agora um ano que publiquei um artigo de opinião, intitulado Novos Pobres, em que assumia «que estes vão juntar-se fatalmente aos pobres que já existem. Acrescentava que nessa «soma infeliz cabem, desde há algum tempo, todas as famílias atingidas pelo desemprego e endividamento, o que as leva a não conseguirem cumprir as suas obrigações». Tal como havia lido numa reportagem sobre o assunto, «a chamada classe média, esganada pelos créditos ou apanhada nas malhas do desemprego crescente, constitui uma nova forma de pobreza».
Actualmente, nada mudou para melhor. Pior, a frase com que concluía o meu raciocínio na altura está cada vez mais presente, isto é, «a classe média, sempre a maior sofredora e vítima de todos os esforços necessários, está a esvair-se porque não aguenta o ritmo de uma sociedade que, por vezes, parece querer vê-la morta.»
Assim, perante os novos dados trazidos a público na semana passada, o próprio Presidente da República, Professor Cavaco Silva, destacou o trabalho das misericórdias no que se refere a "uma certa pobreza envergonhada" que existe no país, sublinhando que quem antes ajudava agora precisa de ajuda, acrescentando ainda que estão a surgir novas formas de pobreza e de exclusão social, fruto dos maiores riscos de desemprego que existem e das dificuldades de pagamento dos empréstimos para comprar casa que muitas famílias enfrentam, ou seja, a nova pobreza afecta pessoas que procuram esconder a cara no momento em que procuram ajudam.
As pessoas, ou seja muitos de nós, precisam de ajuda. Neste capítulo, e porque alguns membros do Vialgarve tiveram o prazer de jantar recentemente com o Professor Adriano Pimpão, responsável pelo Banco Alimentar Contra a Fome Algarve, torna-se imperioso reclamar o apoio para instituições como esta e outras similares, fundamentais na ajuda aos mais necessitados, assim como, também gostaria de realçar aqui o papel das misericórdias, que muito têm trabalhado em prol de milhares de pessoas.
Apelo pois ao envolvimento de todos quantos puderem ajudar. E nisso incluo, sobretudo, um apelo à consciência de todas as pessoas que lideram organizações, sejam governamentais ou não, que costumam estar acima de tudo e todos, habituadas a um distanciamento que choca qualquer um, mas que devem ser chamadas à razão para que possam ajudar quem mais necessita nestes tempos difíceis. O seu contributo, mais do que um acto de cidadania, é um dever moral.

Publicada no Jornal do Algarve, edição de 4 de Dezembro de 2008
Share |