quarta-feira, 11 de novembro de 2009

UMA ATITUDE DE ANCIÃO

Ansião, agora com s, é um concelho que fica no distrito de Leiria. Tal como tantos outros lugares um pouco por esse mundo fora, tem sofrido com a crise mundial que se instalou e teima em não partir.
Esta é a história de seis empresas que estavam em más condições e cujo futuro não augurava nada de bom. Tal como nos é descrito pelo Jornal Horizonte, na sua edição do mês passado, “a ideia da fusão de cinco empresas de Avelar e uma de Castanheira de Pêra pode ser a solução para salvar a indústria têxtil na região, que agoniza há vários anos com as empresas em processo de ruptura, algumas em insolvência, com dispensa de funcionários e vários meses de ordenados em atraso.”
Esta decisão merece algumas considerações. Todavia, necessitamos de recuar um pouco atrás, de forma a podermos acrescentar alguns dados a este processo.
No impasse que se gerou, e ao invés de se deixar morrer um conjunto de empresas centenárias, e por isso com uma história e um know how que importava não desbaratar, o sindicato promoveu uma reunião com os cerca de 350 colaboradores dessas empresas e propôs que se construísse uma plataforma de entendimento que catapultasse as mesmas para outra dimensão, e dessa forma, para uma oferta superior, o que ao mesmo tempo, lhes conferiria outra vantagem competitiva.
Depois de uma reunião em meados de Setembro onde se reuniram empresários, funcionários, sindicato, elementos do Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à Inovação (IAPMEI), da Segurança Social e da Caixa Geral de Depósitos, foi apresentado o projecto "B4F" que pretende aglutinar as empresas Fiar, Finistex, Fareleiros, Pivot e V. Fino de Avelar e Barros da Castanheira de Pêra numa só.
Conforme nos adianta o mesmo órgão de comunicação local, “esta nova empresa vai gerir as seis, através do trabalho de um administrador em cada uma delas, que continuará com um modo de funcionamento independente.”
Permitam-me pois alguns destaques que me parecem óbvios. Num tempo de grande incerteza e onde tem proliferado um clima pessimista e encerramentos (infelizmente, alguns de qualidade duvidosa), é de aplaudir a presença e a missão do sindicato, finalmente com uma atitude construtiva ao invés da sua habitual má conotação.
Registo também com agrado a própria acção dos trabalhadores que terão optado pelo caminho mais difícil mas que tiveram o retorno da sua argúcia. Realço o papel dos próprios administradores das empresas que souberam olhar em frente em vez de olhar apenas para os seus próprios umbigos, preferindo a união à morte lenta.
Finalmente, um registo para a presença do Estado enquanto garante da oportunidade criada, optando por fazer em vez de burocratizar o processo, tendo-se revelado fundamental para este desiderato a acção do IAPMEI que garantiu um grande apoio, tal como as negociações com a Segurança Social e a Caixa Geral de Depósitos, que delinearam um plano de reestruturação para pagamento das dívidas.
Em suma, não só um exemplo que mereceria uma outra divulgação, como estamos perante uma reflexão profunda e obrigatória a todos os que estando em condições semelhantes, preferem claudicar do que abrir os seus horizontes.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

A SOMBRA DOS VENCIDOS

Perder custa, dói mesmo. Apenas quem conhece esse absoluto silêncio ensurdecedor que se sente quando as sedes ficam vazias, depois de uma derrota eleitoral, é que sabe dar valor à política, dentro do quadro democrático onde ganhar ou perder é isso mesmo, ou seja, o exercício prático da própria democracia.

Regra geral e única, perder não traz holofotes nem notícias espampanantes no dia seguinte. E, se as trazem, certamente, nunca é por bons motivos. Temos, portanto, uma cultura onde os vencedores são tudo e os derrotados são quase nada.

Acho que como em tudo na vida, importa saber ganhar e saber perder. Atrevo-me até a desequilibrar os pratos da balança. Para mim, é mais importante saber perder, se soubermos meditar o porquê desse resultado, do que ganhar e festejá-lo de uma forma demasiado arrogante e pouco edificante. Não querendo desejar a infelicidade a alguém, mas persisto numa ideia: há por aí muita gente que deveria perder para saber ganhar.

Mas voltemos aos vencidos e aos seus problemas. Embora esteja hoje afastado da vida política activa, principalmente no meu concelho e por razões profissionais, sei o que é perder eleições, entendo a revolta que se cria dentro de nós após os desaires e compreendo perfeitamente o quão pesados são os dias seguintes a uma derrota. Aprendi e cresci com isso, e hoje, por mais paradoxal que tal pareça, sinto que em cada desses momentos cresci como pessoa.

Todavia, há processos e processos. Não adianta pois perder umas eleições sem tentar perceber o que se passou, meditar sobre qual o nosso comportamento, aferir sobre a campanha que fizemos e se soubemos ou não transmitir as nossas ideias correctamente.

Esta reflexão que nada tem de persecutória contra os outros, porque são sempre mais fáceis de culpabilizar, tem o condão de nos ensinar e fazer ver, de uma forma mais fria, os erros cometidos de modo a que não sejam repetidos.

Apenas esta catarse de pensamento nos permitirá chegar ao que se exige, isto é, o pôr em causa das nossas atitudes perante os desafios que não chegámos a vencer.

Quem souber interpretar os sinais que muitos emitiram e que não foram escutados; quem souber ultrapassar as derrotas vendo além das mesmas, na esperança de que possam ser o princípio de outras vitórias; quem tiver capacidade de redesenhar o seu processo todo e não ficar amarrado à ideia que apenas faz aquilo que acha, porque se sente no pleno da razão, mas que não tem correspondência ao mundo real; esses serão os vencidos mais capazes de se tornarem vencedores.

A vida é todo um processo. A política não se lhe fica atrás. Bebem ambas as mesmas condições em que são vividas. Apenas é necessária a inteligência para saber ultrapassar os problemas. Logo a questão não se coloca nos termos dos coitados dos vencidos. Colocar-se-á antes no plano de quem quiser aprender algo com a derrota. Aí, pelo que sinto, uns terão a mestria de ficarem abertos a outros conselhos ou naturalmente cederão os seus lugares, outros nem por isso.

Publicado no Jornal Região Sul, edição de 28 de Outubro de 2009. Link:

http://www.regiao-sul.pt/noticia.php?refnoticia=99353

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